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Versão de Catarina

Quando eu poderia imaginar, há alguns anos atrás, passar uma virada de ano vendo o estouro dos fogos no Farol da Barra, do mar da Baía de Todos os Santos? Mas passamos assim, sob um céu estrelado e mar de almirante. E tudo aconteceu por acaso, com um convite especial dos funcionários da Marina, que ganharam esse passeio de catamarã, e quiseram nos incluir na festa. O ambiente era todo “família!”: o funcionário com a esposa, a mãe, e os filhos; ficamos ao lado de um casal assim, passeando pela baía, vendo os prédios iluminados ao fundo, como a Igreja de Nosso Senhor do Bonfim, tendo os baianos por guias turísticos. De tão familiar, teve até vômito da filha do casal ao nosso lado; normal, a chance de criança passar mal com o balanço do mar é sempre maior.
Na hora da virada, nos deram champanhe, e reparamos que todos os baianos, antes de tomar o primeiro gole da bebida, jogavam na água um golinho, para o “santo”; na dúvida, fizemos o mesmo, sabe-se lá! Há muitas coisas que desconheço sobre as crenças dos baianos, e que são muito particulares. E se eu sei pouco, imaginem os estrangeiros, que fazem a maior confusão. Com grande dificuldade, tentei explicar para uma francesa sobre culto à Yemanjá, e o porquê Procissão2de jogarem flores na água para ela. Esclareci que as flores eram a devida homenagem a quem nos protege, no mar e em terra, durante todo o ano, assim como o perfume, que ela também gosta, por tratar-se de uma figura feminina. Então, ela me perguntou o porquê de uma figura feminina tomar conta dos mares, e eu respondi que deve ser porque o mar é temperamental, como uma mulher bonita e vaidosa, que às vezes fica muito brava, mas, no dia seguinte, aparece para você como uma flor de formosura, mansinha, lhe conquistando, por completo. Quando ela me perguntou se Oxalá era pai de Yemanjá, vi que ia ser difícil, pressenti que a próxima pergunta ia ser quem era o herdeiro do trono, ou se havia democracia entre as forças da natureza, então eu disse que havia livros específicos sobre o assunto e ela se deu por satisfeita, porque franceses adoram livros, acham que eles explicam tudo sobre o mundo.
No dia seguinte, pela manhã, ficamos aguardando a procissão marítima de Bom Jesus dos Navegantes, que ia sair do 2º Distrito Naval, perto da Marina. Do nosso lado, no píer, também aguardava uma família baiana, de duas filhas que foram levar o pai para assistir a tudo de perto, como ele faz há mais de 15 anos, como promessa. Achei muito tocante a forma como os baianos tratam os seus idosos, que também fazem por merecer o carinho que lhes dão. FamíliaBaianaSalvador
A conversa toda no píer girava em torno de qual figura santa seria transportada na Galeota, se Nossa Senhora da Conceição da Praia iria junto, ou não, se os remadores agüentariam remar todo o trajeto, ou seriam rebocados, e se, por sua vez, estes seriam oficiais da marinha, ou pescadores usando o uniforme oficial, e ainda, qual seria o trajeto da embarcação, etc… . Assim passamos a primeira manhã do ano, envoltos em especulações, dando risadas.
“Tchau. I have to go now, I have to go now. Tchau!”, como diz a música baiana, era hora de ir embora de Salvador, muito mais tarde ficaria ruim para descer a Costa, parando nos lugares que pulamos na subida. Não fiquei triste, porque sei que vou voltar. Abastecemos bem o barco com alimentos, água e combustível, e saímos na manhã do dia 05 de janeiro. Na saída da Baía de Todos os Santos, cruzamos com dois enormes navios de cruzeiro, indo em direção a Salvador, como fazem todas as semanas, nesta época do ano, transportando perto de 3.000 passageiros, cada.
Não sei se por uma infeliz coincidência, mas a água da baía estava com muito lixo, garrafas PET e sacos plásticos, de montão.
Logo nas primeiras horas de viagem, vi um peixe pulando atrás do barco: o infeliz tinha mordido nossa isca. O Dorival correu para puxar, e colocou o peixe no balde, para terminar de agonizar. Foi o primeiro peixe pescado e embarcado, que gerou um sentimento duplo, de pena pela situação do bicho, dando os últimos suspiros, e de satisfação pelo feito. Resultado: aceitei o presente do mar, que virou muqueca na nossa chegada em Camamu.
Tudo o que não ventou na nossa vinda, venta aqui em Camamu, que beleza! Mas tem muita correnteza, tem que ficar esperto. E agora há pouco chegou o barco da francesa “perguntadeira”. Será que ela leu o livro? Fato é que, gente assim, interessada, estuda e vai longe. Bem diferente do pessoal do “Rally Ile du Soleil”, que não conversava com ninguém local, e nem com os outros franceses que chegavam, e não eram participantes do Rally. Quem dirá ceder um espaço no píer que eles alugaram! Esse egoísmo escandalizou os baianos da marina.
Aqui em Camamu acordamos ao som de vários pássaros, principalmente, o sabiá. Interessante que, em São Paulo, eles aparecem só no mês de setembro, devem migrar para o nordeste, nesta época.
E eu já estou pensando na feira de Maraú, que acontece aos sábados de manhã. A minha vida é pensar em provisões para o barco. Vou convencer o Dorival a ir até lá, na sexta-feira próxima, sabe como é….

 

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Versão do Dorival

O Natal em Salvador foi calmo e tranqüilo. A noite da passagem de ano para  2010 foi bem agitada. Fomos convidados para aperitivos no catamarã de um francês, onde já estavam outros casais, também franceses. Nos serviram  algo que eles pensavam ser caipirinha. Sem chance, fui para a cozinha fazer caipirinhas de verdade; fiz muitas, tomei uma só, com muito gelo. Ocupado com isso, quando me dei conta vi que estavam formados os tradicionais grupos mulheres, de um lado, e homens, do outro. Não sei sobre o que elas estavam falando, mas eles contavam vantagens das travessias do Atlântico.
De repente, percebi que quase todos se mudaram para outro catamarã; ficamos eu, a Catarina e um outro casal. A mulher estava tentando explicar que, para nós, a festa tinha acabado ali, e que não tínhamos sido convidados para a ceia que aconteceria no outro catamarã. Esse casal nos convidou para irmos juntos ao Pelourinho. ProcissãoAcho que o comandante do outro catamarã percebeu o que estava acontecendo e veio, meio sem graça, convidar a nós e ao outro casal de franceses para irmos à ceia. Aceitamos, mas, em seguida, fomos convidados pelo pessoal da administração do Tenab para ir com eles, em um dos Catamarãs a motor que fazem a travessia de Salvador para Morro de São Paulo, passear pela Baia de Todos os Santos e acompanhar, embarcados, a queima de fogos na Barra. Lá estavam as famílias dos funcionários e das terceirizadas que cuidam da segurança e limpeza. A companhia cedeu o catamarã, tripulantes e combustível, e cada um trouxe um pouco de bebida, refrigerante e salgadinhos de todos os tipos, ótimos, é claro. Fomos muito bem recebidos, sem formalidades, e passamos uma excelente noite com eles, com direito a chuva de champanhe à meia noite. Todos muito felizes, junto com seus familiares e muitas crianças. Ninguém bebeu demais, não houve qualquer tipo de problema.
Dia 1º, acontece a tradicional procissão de Bom Jesus dos Navegantes. É uma festa marítima. A imagem que, no dia anterior, veio para a igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, segue embarcada na galeota Gratidão do Povo até a Igreja de Boa Viagem. Depois que a geleota passa pelo Forte de São Marcelo, muitas embarcações se juntam à procissão e o inicio solene se transforma em uma festa popular muito colorida e alegre.Primeiropeixecamamu
O dia chegou, 5 de janeiro, saímos de Salvador às 7:00 hs com destino a Camamu. Sem vento, motoramos em direção à barra da Baia de Todos os Santos. Sem ondas, um dia lindo. Um dos funcionários do Tenab me disse que, quando estivesse perto da bóia cega próximo ao Farol da Barra, colocasse a isca na água porque ali é bom para pescar. Na mosca, peguei um Dourado de uns três quilos. Com o barco no piloto automático, motorando, e com a Catarina de vigia, eu fiquei um tempão limpando o peixe. Depois, ela foi temperar, para fazer uma moqueca em Camamu.
O mar estava muito calmo, ondas de no máximo um metro, com período de 12 segundos, uma maravilha. O mar estava azul e, sem vento, a transparência da água era tanta que pude ver um cardume de tubarões. O vento só apareceu depois das 14:00 hs, dez a doze nós, través. Velejamos até o Campinho na Baia de Camamu, com velocidades entre 6 e 7 nós, ajudados por um nó de correnteza. Chegamos às 16:30, com a maré enchendo. O lugar aqui é lindo, para qualquer lado que se olhe, se vêem praias com coqueiros ou manguezais imponentes.
Muitas escunas de turismo passam lotadas de turistas em direção à Ilha do Goió. As pousadas no Campinho estão lotadas e nesta ancoragem somos maioria, são quatro barcos brasileiros para um francês.
Campinhocamamu
Ancoramos com cuidado, lancei muita corrente e, como em Suape, usei um estrapo de cabo têxtil, com uns dois metros de comprimento, para prender a corrente ao barco. Esse cabo evita que, durante  os movimentos do barco devido à correnteza da maré vazante, combinado com o vento, a corrente fique raspando na pintura da proa.
Depois de descansar um pouco, jantamos a moqueca feita com o dourado pescado, muito bom.
Aqui, a internet via celular cai muito e é muito instável. Vou tentar me comunicar com o mundo, com certa dificuldade.

5 Responses to “Luthier – De Salvador a Camamu”

  1. joao gimenes disse:

    Pai,
    Acho que não existe coisa que você não consiga fazer, não é mesmo? Baita peixão!!!!! Deve ter ficado muito bom!!!! Só espero que a Tata não tenha colocado coentro como eles fazem ai na bahia!!!
    Estamos de olho na sua viagem!!!
    Um abração.
    Joao

  2. Emileine Ceron disse:

    Ah fiquei muito feliz que finalmente teve um peixe pescado pelo capitão, já sei dos dotes culinário da Catarina que arrasa, e do churrasco maravilhoso que meu sogro preparou quando estavamos em Salvador, mas faltava um peixinho ou melhor um peixão…
    Bjos com Saudades!!!

    Emileine

  3. Dorival e Catarina disse:

    João, a moqueca foi sem coentro porque eu estava sem. Mas, já me acostumei com o sabor. Emileine, estou longe de ser uma cozinheira baiana.
    Beijos
    Catarina

  4. Gunnar Hansen disse:

    Prezados Catarina e Dorival;

    parabens pelos ótimos artigos do Diário. Um feliz 2010 pra vcs. Continuo acompanho vcs.
    Um abraço Gunnar.

  5. Dorival e Catarina disse:

    Olá Gunnar,

    Agradecemos os cumprimentos e elogios.
    Um feliz 2010 para você e sua família.
    Abraço

    Dorival e Catarina

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